VI Colóquio sobre o STF

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O Instituto Victor Nunes Leal tem o grande privilégio de participar, ao lado da Associação dos Advogados de São Paulo, deste VI Colóquio sobre o Supremo Tribunal Federal.
É uma parceria que se oferece, mais uma vez. E, novamente, com a manifestação decisiva do Presidente Renato Cury e contando com a presença de personalidades tão expressivas e brilhantes, no âmbito do pensamento jurídico brasileiro contemporâneo.
Falar em Supremo Tribunal Federal é também ressaltar a memória, a originalidade, o labor de Victor Nunes Leal, patrono de nosso Instituto.
Da sua obra clássica Coronelismo, Enxada e Voto extraio uma premonição do cenário que temos hoje diante de nós, no qual assinala vivamente a bajulação, o servilismo e a passividade diante do mandonismo e em face do Coronelismo. Escreveu nosso patrono, no final da década de 40 numa obra que já nasceu clássica (Ed. Nova Fronteira, prefácio de Barbosa Lima Sobrinho, 1949): “Completamente analfabeto, ou quase, não lendo jornais, nem revistas (…), o trabalhador rural, a não ser em casos esporádicos, tem o patrão na conta de benfeitor. E é dele, na verdade, que recebe os únicos favores que sua obscura existência conhece. Em sua situação (refere-se ao trabalhador rural), seria ilusório pretender que esse novo pária tivesse consciência do seu direito a uma vida melhor e lutasse por ele com independência cívica. O lógico é o que presenciamos: no plano político, ele luta com o “coronel” e pelo “coronel”.
Digo eu: ele “serve” ao Coronel. Este é o universo que a humanidade, numa outra dinâmica, em cenário contemporâneo, tem diante de si, o do servilismo, da servidão voluntária, com o dramático retrocesso democrático, como consequência indesviável.
As democracias estão morrendo não mais com rupturas violentas. Agora, a escalada de autoritarismo se dá com o apoio da população ao enfraquecimento de instituições críticas, como a imprensa, e a erosão de normas políticas historicamente conquistadas. É a servidão voluntária diante do medo de liberdade, percepção canalizada desde o século XVI por Étienne de la Boétie (Discurso sobre a servidão voluntária) e lapidada por Erich Fromm no século XX (El Miedo a la Liberdad).
“São (…) os próprios povos que se deixam, ou antes, se fazem governar, pois cessando de servir estarão livres; é o povo que se sujeita, que se corta a garganta, que, podendo escolher entre ser subjugado ou ser livre, abandona a liberdade e toma o jugo, que consente no mal, ou antes, o persegue”, ensinou o genial pensador francês.
“Una parte de la población se inclinó ante el régimen nazi sin presentar mucha resistencia, pero también sin transformarse em admiradora de la ideologia y la práctica política nazis. En cambio outra parte del pueblo se sintió hondamente atraída por esta nueva ideología, vinculándose de una manera fanática a sus apóstoles”, explica Eric Fromm.
Os eleitores estão fazendo suas escolhas e gerando a progênie do autoritarismo, segundo o modelo de Donald Trump. Não indicam propriamente preferencias fascistas. Seguem, em servilismo explicito, apurado nas urnas, aquilo que os autocratas ditam.
Robert Fico, Recep Tayyp Erdogan, Vladimir Putin, Victor Orban, Jair Bolsonaro, eles não teriam avançado tanto, em suas marchas e suas propostas, nem, alguns, tomado o caminho do autoritarismo na condução da gestão pública, sem o estímulo dos falsos avatares e suas mensagens, segundo as quais as regras do Iluminismo e da Constituição Americana já não valem tanto como se pensava. Nenhum aprendiz de autocrata é limitado pelo medo da reação do mundo ocidental, porque os detentores de poder, com o apoio irracional das populações, estão liquidando com o sonho de Thomas Jefferson.

Esse VI Colóquio sobre o Supremo Tribunal Federal faz renascer a esperança. Nem tudo está perdido. A chave está na justiça. O Poder Judiciário segue independente, altivo, coragem moral a toda prova, e pode apontar os caminhos que a História indica em direção ao futuro, o qual, confiamos, será reconstruído sobre pilares democráticos.

(IV COLOQUIO SOBRE O STF – PEDRO GORDILHO)

( * ) Discurso pronunciado, em 24.8.19, pelo advogado Pedro Gordilho, Presidente do Conselho de Curadores do Instituto Victor Nunes Leal, no evento patrocinado pela Associação dos Advogados de São Paulo realizado na cidade de Campos do Jordão (SP).